DOENÇAS & CONDIÇÕES
Obesidade infantil: o que é, causas e como prevenir
A obesidade na infância também aumenta a probabilidade de manter obesidade na vida adulta, ampliando o risco de complicações

Mariana Del Bosco
5min • 19 de nov. de 2025

O consumo excessivo de alimentos ultraprocessados é uma das principais causas do acúmulo excessivo de gordura corporal em crianças | Foto: Freepik
Você sabia que a obesidade infantil é um fator de risco importante para doenças crônicas na vida adulta, como diabetes tipo 2 e hipertensão? No Brasil, uma em cada três crianças e adolescentes entre 10 e 19 anos está acima do peso, segundo levantamento nacional com base em dados do Sistema Único de Saúde (SUS). A taxa de sobrepeso nessa faixa etária cresceu quase 9% em dez anos.
A exposição prolongada ao excesso de gordura corporal na infância pode desencadear uma série de problemas de saúde mais cedo, além de causar outras complicações a curto e longo prazo — afetando o desenvolvimento físico e psicológico da criança. Vamos entender mais, a seguir!
O que é obesidade infantil?
A obesidade infantil é caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, acima do recomendado para a idade e altura, em crianças de até 12 anos de idade.
A condição acontece quando o corpo recebe mais calorias do que gasta, o que pode ocorrer em uma alimentação rica em ultraprocessados e aliada ao pouco movimento no dia a dia, o grande tempo sentado e o uso excessivo de telas — que fazem o corpo armazenar gordura com facilidade.
Quais os tipos de obesidade infantil?
A obesidade infantil pode ser classificada de duas formas principais pela causa:
Exógena: é causada pela soma de ambiente alimentar desregulado, consumo alto de ultraprocessados, bebidas açucaradas e rotina com pouco movimento. A criança vive em um ambiente que facilita comer muito e gastar pouco;
Endógena: é provocada por alterações internas do organismo. A criança pode ter distúrbios hormonais (como problemas de tireoide ou síndrome de Cushing) ou usar remédios que favorecem ganho de peso, como corticoides.
A obesidade infantil também pode ser dividida pela gravidade, medida pelo IMC para idade e sexo:
- Sobrepeso, aparece quando o IMC está acima do percentil 85 e abaixo do percentil 95;
- Obesidade, aparece quando o IMC está acima do percentil 95;
- Obesidade grave (ou obesidade mórbida) costuma ser usada quando o IMC está em 40 kg/m² ou mais, refletindo acúmulo muito elevado de gordura corporal.
O que causa a obesidade em crianças?
A obesidade é uma doença multifatorial, o que significa que ela é influenciada por uma série de fatores biológicos, comportamentais e sociais, como:
Alimentação inadequada
O consumo excessivo de alimentos ultraprocessados é uma das principais causas do acúmulo excessivo de gordura corporal em crianças.
Refrigerantes, biscoitos, salgadinhos e fast food, por exemplo, são ricos em calorias, gorduras saturadas, açúcar e sódio — mas pobres em nutrientes, como fibras, vitaminas e minerais. Com o tempo, o desequilíbrio favorece o ganho de peso e prejudica o desenvolvimento adequado do organismo.
Além disso, o consumo frequente desses produtos altera o paladar infantil, fazendo com que a criança prefira alimentos muito doces, salgados ou gordurosos, e rejeite opções mais naturais, como frutas, verduras e legumes.
Sedentarismo
O sedentarismo em crianças é caracterizado por longos períodos de inatividade, como assistir televisão, jogar videogame ou usar o celular. O comportamento ficou cada vez mais comum nos últimos anos, com o avanço da tecnologia e a redução das brincadeiras ao ar livre, o que faz com que as crianças gastem menos energia do que consomem.
Quando a baixa movimentação é somada com uma alimentação rica em ultraprocessados e pobre em nutrientes, o resultado é o acúmulo de gordura corporal e o aumento do peso. O sedentarismo também interfere no desenvolvimento muscular, na coordenação motora e na saúde emocional, podendo causar irritabilidade, ansiedade e dificuldade de concentração.
A Organização Mundial da Saúde recomenda que crianças e adolescentes realizem pelo menos 60 minutos de atividade física por dia, incluindo brincadeiras, esportes e jogos.
Fatores genéticos e hormonais
As crianças filhas de pais com obesidade têm maior predisposição genética a desenvolver o mesmo quadro, já que herdam genes que influenciam o metabolismo, o apetite e a forma como o corpo armazena gordura.
Além da herança genética, o ambiente familiar também tem grande impacto: hábitos alimentares inadequados, pouca prática de atividade física e rotina sedentária tendem a ser reproduzidos pelas crianças.
Para complementar, distúrbios hormonais, como hipotireoidismo, síndrome de Cushing e resistência à insulina podem interferir no metabolismo, diminuindo o gasto energético e favorecendo o ganho de peso.
Fatores emocionais
Não é incomum que algumas crianças utilizem a comida como uma forma de compensar sentimentos de tristeza, ansiedade, solidão ou até tédio. O comportamento, conhecido como “fome emocional”, faz com que o alimento se torne uma válvula de escape para lidar com emoções difíceis.
Com o tempo, isso pode gerar um ciclo de dependência: a criança come para se sentir melhor, mas logo sente culpa ou desconforto, o que leva a novos episódios de compulsão alimentar.
Sono inadequado
O sono inadequado na infância altera o equilíbrio hormonal e o funcionamento do metabolismo, aumentando o risco de obesidade. Durante o sono, o corpo regula hormônios importantes relacionados ao apetite, como a leptina (que sinaliza saciedade) e a grelina (que estimula a fome).
Quando a criança dorme pouco, há uma redução da leptina e um aumento da grelina, o que faz com que ela sinta mais fome e tenha maior tendência a consumir alimentos calóricos e ultraprocessados.
Crianças que dormem mal também tendem a ficar mais irritadas, dispersas e cansadas durante o dia, o que reduz a disposição para se movimentar, praticar esportes ou brincar, aumentando o comportamento sedentário e, consequentemente, o risco de obesidade.
Por que a obesidade infantil tem crescido tanto nos últimos anos?
A obesidade infantil no Brasil é um problema de saúde pública crescente, com cerca de um em cada três crianças entre 5 e 9 anos estando acima do peso. Para se ter uma ideia, pela primeira vez na história, o excesso de peso grave superou a desnutrição como a maior forma de má nutrição infantil, de acordo com dados do Fundo das Nações Unidas.
Mas afinal, por que isso está acontecendo? De acordo com a nutricionista Mariana Del Bosco, o país vive uma realidade com ambientes cada vez mais obesogênicos. As crianças estão mais sedentárias, a questão da segurança tende a impedir atividade física e há uma enorme oferta de alimentos de alta densidade energética.
O consumo de ultraprocessados cresceu, e os produtos têm alto teor de açúcar e gordura que aumentam a ingestão calórica e o risco de a obesidade aparecer.
“Todas as esferas da sociedade têm o seu papel. O governo, por exemplo, com políticas que poderiam proteger as crianças, com regulamentação de rotulagem e de publicidade para produtos de criança; a escola, promovendo uma cantina mais saudável, podendo ser um ambiente de educação alimentar e nutricional; as indústrias fazendo uma comunicação clara, melhorando a qualidade de produtos, e a família com uma parcela dessa responsabilização”, explica a nutricionista.
Sintomas de obesidade infantil
A obesidade infantil pode se desenvolver de forma gradual, e nem sempre o quadro é percebido de imediato pelos pais. O principal sintoma é o acúmulo excessivo de gordura corporal, além de sinais como:
- Aumento rápido de peso desproporcional ao crescimento da altura;
- Acúmulo de gordura em regiões como abdômen, braços, coxas e rosto;
- Roupas apertando com frequência ou necessidade de trocar de tamanho fora do padrão esperado para a idade;
- Falta de fôlego ou cansaço durante atividades simples, como subir escadas ou correr;
- Dores nas articulações, especialmente joelhos e tornozelos, devido à sobrecarga do peso.
A criança também pode apresentar sinais comportamentais e emocionais, como:
- Preferência por alimentos ultraprocessados e rejeição a frutas, verduras e refeições caseiras;
- Sedentarismo e desinteresse por atividades físicas;
- Uso excessivo de telas (celular, TV, videogame);
- Baixa autoestima e isolamento social, muitas vezes por causa de bullying;
- Alterações de humor, ansiedade e compulsão alimentar.
Riscos da obesidade infantil
O excesso de gordura corporal na infância pode causar diversos problemas de saúde ainda nessa fase e aumentar o risco de doenças graves na vida adulta. Entre os principais riscos, é possível destacar:
- Diabetes tipo 2;
- Colesterol e triglicerídeos elevados;
- Hipertensão arterial;
- Doenças cardiovasculares precoces;
- Problemas respiratórios, como apneia do sono;
- Alterações hormonais e puberdade precoce;
- Dores nas articulações e deformidades ósseas;
- Esteatose hepática (gordura no fígado);
- Dificuldades de locomoção e baixa resistência física;
- Transtornos alimentares e ansiedade;
- Baixa autoestima e isolamento social;
- Maior probabilidade de obesidade na vida adulta.
Como é feito o diagnóstico?
O diagnóstico da obesidade infantil é feito pelos pediatras através da avaliação do peso, da altura e outros fatores ligados ao crescimento e à composição corporal da criança. O principal parâmetro utilizado é o Índice de Massa Corporal (IMC), cujo valor é comparado com curvas de crescimento específicas para idade e sexo, de acordo com Mariana.
Além do IMC, a avaliação pode incluir também composição corporal, percentual de gordura, circunferências e análise do padrão alimentar. Em muitos casos, são solicitados exames complementares, como:
- Glicemia e insulina;
- Colesterol total e frações (HDL, LDL);
- Triglicerídeos;
- Função hepática (TGO, TGP);
- Função tireoidiana.
Vale ressaltar que o diagnóstico não se baseia apenas em números e é fundamental compreender o contexto alimentar, o nível de atividade física e fatores emocionais e sociais que podem estar contribuindo para o ganho de peso.
Nesse contexto, Mariana explica que o pediatra está na linha de frente dessa triagem, porque acompanha peso e estatura pelo menos uma vez por ano. A observação da curva de crescimento é um dos sinais mais precoces: mesmo antes de cruzar as linhas de sobrepeso ou obesidade, a tendência de subida já é alerta de risco e já justifica avaliação mais detalhada.
Tratamento de obesidade infantil
O tratamento da obesidade infantil deve ser sempre individualizado e supervisionado por profissionais de saúde, envolvendo médico, nutricionista, educador físico e, quando necessário, psicólogo. O objetivo principal não é apenas a perda de peso, mas a mudança de hábitos e a promoção de um estilo de vida saudável que possa ser mantido a longo prazo.
Ele envolve uma série de medidas, como:
Alimentação equilibrada: basear as refeições em alimentos in natura e minimamente processados, como frutas, verduras, legumes, grãos integrais e proteínas magras. Deve-se reduzir o consumo de ultraprocessados, refrigerantes, doces e fast-food;
Rotina alimentar estruturada: manter horários regulares para as refeições e evitar “beliscar” o tempo todo. Fazer as refeições à mesa, sem distrações como TV ou celular, ajuda a reconhecer quando está satisfeito;
Atividade física diária: incentivar pelo menos 60 minutos de movimento por dia, incluindo brincadeiras, esportes e atividades ao ar livre. O objetivo é aumentar o gasto energético e fortalecer músculos e ossos;
Uso de medicamentos (em casos específicos): indicado apenas sob orientação médica, quando há doenças associadas ou obesidade grave que não responde a outras medidas;
Sono adequado: a privação de sono desequilibra os hormônios da fome (grelina e leptina) e favorece o ganho de peso;
Redução do tempo de tela: limitar o uso de televisão, celular e videogame a no máximo duas horas por dia, conforme recomendação da OMS;
Apoio psicológico: ajudar a criança a lidar com sentimentos de ansiedade, frustração e baixa autoestima que podem levar à compulsão alimentar.
Segundo Mariana, se a criança entra na puberdade com peso adequado, o risco de manter obesidade na vida adulta diminui de forma significativa. Por isso, o cuidado precisa começar assim que o risco aparece, e não apenas quando o problema já está instalado.
Dieta restritiva é necessária no tratamento de obesidade infantil?
A dieta restritiva não é indicada no tratamento da obesidade infantil. A criança precisa comer bem para crescer, se desenvolver e construir relação saudável com o alimento. De acordo com Mariana, o foco não é cortar alimentos de forma rígida, mas melhorar a qualidade do que está na rotina da família.
A orientação nutricional busca organizar o entorno: o que entra no carrinho de supermercado, o que está disponível em casa, como a família faz as refeições e como o alimento aparece no dia a dia.
Assim, a rotina será mais equilibrada, com mais alimentos nutritivos e menos ultraprocessados, sem comprometer o desenvolvimento do pequeno. A inclusão de indulgências eventuais, como um sorvete no fim de semana ou uma festinha, faz parte do plano. O resultado vem da mudança sustentada de comportamento, e não de restrição radical.
Quanto de atividade física para crianças é recomendado?
De acordo com o Guia de Atividade Física para a População Brasileira, as recomendações variam conforme a idade e o estágio de desenvolvimento da criança:
- Crianças de até 1 ano: pelo menos 30 minutos por dia em posição de bruços (“de barriga para baixo”), distribuídos ao longo do dia, em diferentes momentos;
- Crianças de 1 a 2 anos: pelo menos 3 horas por dia de atividades físicas de qualquer intensidade, divididas ao longo do dia;
- Crianças de 3 a 5 anos: pelo menos 3 horas por dia de atividades físicas de qualquer intensidade, sendo no mínimo 1 hora de intensidade moderada a vigorosa.
A atividade física para crianças pode acontecer principalmente por meio de jogos, brincadeiras e movimentos espontâneos, mas também pode envolver atividades mais estruturadas, como aulas de educação física, escolinhas de esportes e natação — sempre supervisionadas por pais, responsáveis ou professores.
Alguns exemplos de atividades por faixa etária:
- Até 1 ano: brincadeiras que estimulem movimentos como rolar, engatinhar, sentar, puxar, empurrar, equilibrar-se e alcançar objetos;
- De 1 a 2 anos: atividades que envolvam andar, correr, pular, escalar, lançar e segurar bolas, girar e equilibrar-se;
- De 3 a 5 anos: jogos e brincadeiras como caminhar, correr, chutar, saltar, arremessar e atravessar obstáculos. Nessa fase, a criança também pode participar de esportes, danças, ginástica, lutas e deslocamentos ativos (a pé ou de bicicleta, sempre acompanhada por um adulto).
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É possível prevenir a obesidade infantil?
A obesidade infantil pode ser prevenida, principalmente com hábitos saudáveis adotados desde os primeiros anos de vida. A prevenção começa em casa, com o exemplo dos pais, e deve envolver alimentação equilibrada, prática de atividade física e um ambiente emocional saudável. Veja alguns cuidados:
- Oferecer frutas, verduras, legumes, grãos integrais e alimentos naturais no dia a dia, evitando ultraprocessados, refrigerantes, doces e fast-food;
- Manter horários regulares, comer à mesa e evitar distrações como TV e celular durante as refeições.
- Manter a amamentação exclusiva e em livre demanda até os 6 meses, o que ajuda a regular o apetite e reduzir o risco de obesidade futura;
- Crianças maiores de 6 meses devem beber água antes, durante e após a atividade física.
- Estimular brincadeiras ativas, esportes e atividades ao ar livre diariamente, como caminhadas, corridas, danças e ginásticas;
- Reduzir o tempo em frente à televisão, computador e celular a no máximo duas horas por dia.
Quanto mais cedo os hábitos forem incorporados à rotina familiar, maiores serão as chances de a criança crescer saudável e manter um peso adequado na vida adulta.
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Perguntas frequentes
Como saber se meu filho está acima do peso?
O peso isolado não é suficiente para avaliar a obesidade infantil. O pediatra utiliza o IMC (peso dividido pela altura ao quadrado) e compara com curvas de crescimento específicas para cada faixa etária. Quando o valor ultrapassa o percentil 97, a criança é considerada obesa.
O acúmulo de gordura no abdômen, os hábitos alimentares, o nível de atividade física e o histórico familiar também entram na avaliação. Por isso, manter acompanhamento regular com o especialista é importante para identificar fatores de risco de forma precoce.
A obesidade infantil tem cura?
Sim, é possível reverter o quadro de obesidade infantil com mudanças de estilo de vida. Na infância, o organismo ainda está em formação, o que facilita o controle do peso quando há intervenção precoce.
O tratamento envolve alimentação equilibrada, estímulo à atividade física e acompanhamento médico e nutricional. O foco não é apenas emagrecer, mas adotar hábitos que possam ser mantidos por toda a vida.
Quando procurar ajuda profissional?
Os pais devem procurar um pediatra ou nutricionista quando perceberem ganho de peso acelerado, cansaço, falta de disposição para brincar ou sinais de baixa autoestima.
Mesmo em casos leves, o acompanhamento profissional é importante para evitar que o quadro se agrave. Quanto mais cedo o diagnóstico e a orientação, maiores as chances de sucesso.
A obesidade infantil pode continuar na vida adulta?
Sim! Pesquisas mostram que cerca de 70% das crianças com obesidade se tornam adultos obesos, principalmente quando o problema não é tratado precocemente. Isso aumenta o risco de desenvolver doenças crônicas, como diabetes, hipertensão e doenças cardiovasculares. Assim, a infância é a fase mais importante para agir e tratar a condição.
A amamentação ajuda a prevenir a obesidade infantil?
Sim, pois o aleitamento materno exclusivo até os 6 meses de idade ajuda a regular o apetite da criança e favorece o desenvolvimento de um metabolismo saudável. O leite materno contém todos os nutrientes necessários e estimula o bebê a reconhecer os sinais de fome e saciedade, o que reduz o risco de obesidade no futuro.
Crianças obesas podem praticar qualquer tipo de esporte?
Sim, desde que respeitadas suas condições físicas e sob orientação de um profissional. Esportes como natação, caminhada, ciclismo e dança são boas opções, pois reduzem o impacto nas articulações e estimulam o prazer pelo movimento.
O mais importante é que a criança se divirta e mantenha a regularidade, sem sentir que o exercício é uma punição.
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