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Síndrome de Li-Fraumeni: conheça a condição que aumenta o risco de câncer

A condição genética aumenta muito o risco de desenvolvimento de vários tipos de tumores ao longo da vida.

Dr. Thiago Chadid

Dr. Thiago Chadid

5min • 19 de dez. de 2025

Profissional de saúde coletando amostra oral de um jovem para teste genético usado na investigação da síndrome de Li-Fraumeni.

A síndrome de Li-Fraumeni aumenta de forma significativa o risco de vários tipos de câncer em idades mais precoces | Foto: Freepik

Você já ouviu falar na síndrome de Li-Fraumeni? Embora seja rara no mundo, a condição é muito mais comum no Sul e no Sudeste do Brasil. Ela é marcada por uma alteração no gene TP53, conhecido como “gene guardião” por atuar na proteção do DNA contra danos que podem levar ao surgimento de tumores.

A mutação compromete esse sistema de defesa natural, facilitando o acúmulo de alterações genéticas ao longo da vida e aumentando o risco de vários tipos de câncer, muitos deles surgindo ainda na idade adulta jovem.

Segundo o oncologista Thiago Chadid, a condição ganhou destaque no país por causa de um fenômeno genético chamado efeito fundador, associado a um ancestral português que teria transmitido a mutação para milhares de descendentes a partir do século XVIII.

Por causa dessa herança, muitas famílias podem carregar a alteração sem saber, vivendo com risco aumentado para vários tipos de câncer, como tumores de mama, tumores do sistema nervoso central, sarcomas e outros.

Afinal, o que é a síndrome de Li-Fraumeni?

A síndrome de Li-Fraumeni é uma condição genética rara caracterizada por uma mutação no gene TP53, um gene fundamental para proteger o DNA das células contra danos que podem causar tumores.

Conforme explica Thiago, o TP53 atua como um sensor de dano no DNA: quando surge uma mutação, ele identifica o problema, tenta corrigir o defeito e, se a célula estiver muito comprometida, ativa mecanismos que levam à morte celular programada, impedindo que uma célula defeituosa continue se multiplicando e se transforme em câncer.

Quando o TP53 não funciona corretamente, o organismo perde parte da sua capacidade de reparar erros genéticos ou eliminar células defeituosas antes que elas se transformem em tumores.

Quando a pessoa nasce com uma mutação herdada do pai ou da mãe no gene TP53, e ocorre perda de função nas duas cópias do gene, o organismo fica sem esse sistema de proteção. O DNA passa a acumular mutações com muito mais facilidade ao longo da vida, e células alteradas conseguem escapar dos mecanismos naturais de defesa e evoluir para tumores.

Por isso, a síndrome de Li-Fraumeni aumenta de forma significativa o risco de vários tipos de câncer em idades mais precoces.

Como a síndrome de Li-Fraumeni é transmitida?

A síndrome de Li-Fraumeni é transmitida de forma hereditária, por meio de uma mutação no gene TP53 que passa de geração em geração.

A transmissão ocorre em um padrão chamado autossômico dominante, o que significa que:

  • Um único gene alterado já é suficiente para aumentar o risco de câncer;
  • Qualquer filho de um indivíduo com a mutação tem 50% de chance de herdar a alteração;
  • Tanto homens quanto mulheres podem transmitir a mutação igualmente.

Quando a pessoa recebe a cópia alterada do pai ou da mãe, ela já nasce com parte da função do TP53 comprometida. Ao longo da vida, basta que a segunda cópia do gene sofra mutação espontânea para que se perca totalmente o mecanismo de proteção do DNA, aumentando a probabilidade de tumores.

Por isso, famílias com história de vários cânceres em idades jovens, ou tumores considerados raros antes dos 40 anos, costumam ser investigadas para essa mutação.

Quais tumores a síndrome pode causar?

De acordo com Thiago, a pessoa pode desenvolver tumores em diferentes órgãos, muitas vezes mais cedo do que o esperado para a população geral. Entre os locais mais frequentemente afetados, destacam-se:

  • Mama;
  • Trato gastrointestinal;
  • Pulmão;
  • Sistema nervoso central;
  • Glândulas endócrinas, como adrenal;
  • Outros sítios, incluindo ossos e tecidos moles.

Também pode ocorrer mais de um tumor primário ao longo da vida na mesma pessoa, resultado direto da incapacidade do organismo de impedir que novas mutações se acumulem e originem novos cânceres.

Os tumores associados à síndrome de Li-Fraumeni tendem a ser mais agressivos, uma vez que acumulam um número maior de mutações e apresentam mais mecanismos de resistência.

Quando o câncer reúne muitas alterações genéticas, o comportamento das células tumorais torna-se mais imprevisível: o tumor cria rotas alternativas para continuar crescendo, mesmo diante do tratamento, dribla terapias que miram um único alvo e, com frequência, apresenta respostas menos duradouras a determinadas drogas.

Por que o câncer aparece mais cedo na síndrome de Li-Fraumeni?

A manifestação costuma ser mais precoce porque, sem o gene guardião funcionando bem, os danos que se acumulam ao longo dos anos não são reparados de modo adequado. A rotina atual, marcada por exposição à radiação, hábitos alimentares irregulares, sedentarismo, tabagismo e outros fatores ambientais, intensifica ainda mais o impacto da predisposição genética.

Thiago explica que, enquanto uma pessoa sem mutação costuma desenvolver câncer com maior frequência após os 60 ou 70 anos, alguém com síndrome de Li-Fraumeni pode apresentar tumores significativos já na faixa dos 20, 30 ou 40 anos.

Como é feito o diagnóstico da síndrome de Li-Fraumeni?

O diagnóstico da síndrome de Li-Fraumeni é feito por meio de avaliação clínica, história familiar detalhada e testes genéticos, que confirmam a presença de mutação no gene TP53.

De forma geral, o processo envolve:

  • Investigação da história pessoal e familiar de câncer, especialmente quando há tumores em idades jovens, múltiplos cânceres na mesma pessoa ou tipos de câncer característicos da síndrome;
  • Avaliação por especialista em genética, que analisa padrões familiares, identifica critérios clínicos (como os critérios clássicos ou critérios de Chompret) e determina se há indicação para exame;
  • Teste genético específico para o gene TP53, realizado a partir de amostra de sangue ou saliva, que confirma ou descarta a presença da mutação;
  • Aconselhamento genético, etapa fundamental antes e depois do teste, para orientar sobre implicações médicas, emocionais e familiares do diagnóstico.

Segundo Thiago, quando a mutação é confirmada, a família deve ser orientada de forma cuidadosa, e outros parentes podem ser indicados a realizar o teste, sempre com apoio de aconselhamento genético para esclarecer riscos, implicações e estratégias de acompanhamento.

Cuidados com a síndrome de Li-Fraumeni

A síndrome de Li-Fraumeni não possui, por enquanto, um protocolo único e rígido seguido por todos os serviços de saúde. A ideia é reduzir ao máximo fatores que aumentem o acúmulo de mutações ao longo da vida. As principais orientações incluem:

  • Evitar a exposição ao cigarro;
  • Redução ou suspensão do álcool;
  • Manter uma alimentação saudável, com alimentos pouco processados e ricos em fibras;
  • Prática regular de atividade física;
  • Proteção da pele contra radiação ultravioleta;
  • Realização periódica de consultas e exames de rastreamento, conforme idade e histórico familiar.

A proposta é diminuir a exposição a fatores que estimulam danos ao DNA e, ao mesmo tempo, identificar qualquer alteração o mais cedo possível.

É possível prevenir a síndrome de Li-Fraumeni?

A prevenção absoluta não é possível, já que se trata de uma alteração herdada. Ainda assim, a combinação de vigilância constante, diagnóstico precoce e escolhas de estilo de vida mais saudáveis pode reduzir o impacto da predisposição e aumentar as chances de identificar tumores em estágios iniciais, quando o tratamento tende a ser mais eficaz.

Confira: Carcinoma basocelular: entenda mais sobre o tipo de câncer de pele que mais afeta os brasileiros

Perguntas frequentes

Qual é a causa genética da síndrome de Li-Fraumeni?

A causa principal é uma mutação no gene TP53, um gene supressor tumoral. O TP53 é conhecido como “guardião do genoma”, porque detecta danos no DNA das células e impede que elas se transformem em câncer.

A síndrome de Li-Fraumeni é sempre hereditária?

Na maioria dos casos (cerca de 70% a 80%), sim, a síndrome é herdada dos pais (mutação germinativa). No entanto, em uma pequena porcentagem dos casos, a mutação pode surgir espontaneamente no indivíduo (mutação de novo), sem histórico familiar aparente.

Quem deve fazer o teste genético?

Pessoas com vários familiares com câncer em idade jovem, com tumores raros antes dos 40 anos ou quem já teve mais de um câncer primário. O ideal é realizar com apoio de aconselhamento genético.

Por que a mutação no TP53 aumenta o risco de tantos tipos de câncer diferentes?

O TP53 é um gene central para a proteção do DNA. Quando ele falha, qualquer célula do corpo fica mais vulnerável a acumular mutações e evoluir para um tumor. Por isso, a síndrome não se restringe a um órgão específico: músculos, ossos, glândulas, cérebro e vários tecidos podem ser afetados.

É possível ter uma vida normal mesmo com a síndrome?

Sim! Apesar do risco, muitas pessoas com síndrome de Li-Fraumeni levam vidas longas, produtivas e com boa qualidade de vida. O grande diferencial é o acompanhamento próximo, a realização de rastreamentos adequados e a adoção de hábitos protetores.

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