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DOENÇAS & CONDIÇÕES

Cigarro eletrônico (vape): conheça os riscos para o coração 

Ao aquecer o líquido interno, o cigarro eletrônico libera substâncias que entram rapidamente na corrente sanguínea

Dr. Pablo Cartaxo

Dr. Pablo Cartaxo

5min • 14 de nov. de 2025

A imagem mostra a mão de uma pessoa segurando um cigarro eletrônico próximo à boca, em ambiente escuro, ilustrando o uso do vape.

Ao contrário do cigarro tradicional, o vape não produz fumaça nem cinzas, o que cria a falsa impressão de segurança | Foto: Freepik

Você já deve ter ouvido falar em cigarro eletrônico, também chamado de vape. O visual moderno, os sabores variados e a ideia de serem uma alternativa “mais leve” ao cigarro comum contribuíram para a popularização dos dispositivos, principalmente entre os jovens.

No entanto, estudos mostram que eles podem causar danos importantes à saúde, especialmente ao coração, aos pulmões e aos vasos sanguíneos. “Muitos acreditam que o vape é apenas ‘vapor de água e sabor’, mas isso é um engano perigoso. O líquido (e-liquid) contém um coquetel químico complexo”, explica o cardiologista Pablo Cartaxo.

Entenda, a seguir, como os cigarros eletrônicos funcionam, o que realmente está presente no vapor inalado e por que seu uso representa um risco sério para o coração.

O que são cigarros eletrônicos e como funcionam?

Os cigarros eletrônicos são dispositivos que aquecem um líquido (conhecido como e-liquid ou juice) para gerar vapor. Ele normalmente contém as seguintes substâncias, apontadas por Pablo:

  • Nicotina: presente na maioria dos dispositivos, muitas vezes em concentrações superiores às do cigarro comum;
  • Solventes (propilenoglicol e glicerina vegetal): quando aquecidos a altas temperaturas, podem formar substâncias tóxicas e inflamatórias, como o formaldeído;
  • Partículas ultrafinas: o vapor inalado contém partículas finas que penetram profundamente nos pulmões, alcançam a corrente sanguínea e provocam inflamação nos vasos. O processo, chamado disfunção endotelial, é o primeiro passo para o desenvolvimento da aterosclerose (formação de placas nas artérias);
  • Aromatizantes: muitos aditivos usados para dar sabor são seguros apenas para ingestão, não para inalação, e podem aumentar a toxicidade e a inflamação nas vias respiratórias e no sistema cardiovascular.

Ao contrário do cigarro tradicional, o vape não produz fumaça nem cinzas, o que cria a falsa impressão de segurança. O usuário inala o vapor, que passa pelos pulmões e chega rapidamente à corrente sanguínea, levando a nicotina e outras substâncias ao cérebro e ao coração.

O mecanismo é bastante simples: uma bateria aquece uma resistência metálica (coil), que vaporiza o líquido armazenado no reservatório. O resultado é uma névoa que imita o ato de fumar, mas com compostos químicos que continuam sendo nocivos à saúde.

Como os cigarros eletrônicos afetam o coração?

A nicotina e as substâncias químicas tóxicas presentes no vapor do cigarro eletrônico interferem no funcionamento dos vasos sanguíneos, na pressão arterial e no ritmo cardíaco.

Segundo Pablo, a nicotina age diretamente sobre o sistema nervoso simpático, provocando uma descarga de adrenalina que eleva de forma aguda a pressão arterial e a frequência cardíaca. Em pessoas com hipertensão ou outras doenças cardíacas, esses episódios repetidos de estresse sobre o coração e os vasos são extremamente prejudiciais e podem desestabilizar o quadro clínico.

“A descarga de adrenalina e a estimulação do sistema nervoso simpático causadas pela nicotina podem funcionar como um gatilho para arritmias cardíacas, especialmente em pessoas já predispostas.”, aponta o cardiologista.

Uma revisão publicada em 2023 na Expert Review of Cardiovascular Therapy também destacou que os vapores inalados contêm substâncias tóxicas que provocam disfunção endotelial, estresse oxidativo e inflamação, processos que favorecem o acúmulo de placas de gordura, condição chamada aterosclerose, que pode, a longo prazo, resultar em infarto agudo do miocárdio.

Cigarros eletrônicos são mais seguros do que cigarros tradicionais?

Apesar das diferenças na maneira como funcionam, os cigarros eletrônicos e os tradicionais são igualmente perigosos para a saúde e expõem o corpo a substâncias tóxicas capazes de causar inflamação, alterar a pressão arterial e aumentar o risco de doenças cardiovasculares.

O cigarro comum produz fumaça pela combustão do tabaco, liberando mais de 7 mil compostos químicos — entre eles o alcatrão, o monóxido de carbono e metais pesados, todos comprovadamente cancerígenos e lesivos ao coração.

O cigarro eletrônico, por outro lado, aquece um líquido que contém nicotina, solventes e aromatizantes, criando um aerossol inalado diretamente para os pulmões. Apesar de eliminar os produtos da combustão, o vapor contém partículas ultrafinas e aldeídos tóxicos que entram na corrente sanguínea e afetam as células endoteliais (camada que reveste os vasos), provocando uma disfunção endotelial que pode guiar para a formação de placas de gorduras nas artérias (aterosclerose).

“O problema dos vapes é que a entrega de nicotina pode ser muito mais alta e rápida, especialmente com os dispositivos mais novos que usam sais de nicotina, o que aumenta o potencial de dependência e o estresse sobre o sistema cardiovascular”, complementa Pablo.

Por que o cigarro eletrônico é tão perigoso para jovens?

O impacto do vape sobre adolescentes é especialmente preocupante por três motivos principais:

  • Dependência precoce: o cérebro jovem ainda está em desenvolvimento. A exposição a altas doses de nicotina altera áreas ligadas à atenção, memória e controle de impulsos, tornando a dependência mais intensa e duradoura;
  • Porta de entrada: estudos mostram que adolescentes que usam vape têm mais chances de migrar para o cigarro tradicional;
  • Dano cardiovascular precoce: a inflamação e o enrijecimento das artérias começam cedo e se acumulam ao longo da vida, aumentando o risco de infartos e AVCs precoces na vida adulta.

Em muitos casos, jovens usam o vape diariamente sem perceber que estão inalando níveis altíssimos de nicotina, superiores aos de um maço de cigarros comum. Isso explica a crescente epidemia de dependência e sintomas de abstinência entre adolescentes.

E os riscos dos cigarros eletrônicos vão além do coração. Uma revisão sistemática publicada em 2021 no periódico Nicotine & Tobacco Research mostrou que o uso de vapes entre adolescentes e jovens adultos está fortemente associado a problemas de saúde mental, como ansiedade, depressão, impulsividade e maior risco de comportamento suicida.

O estudo analisou mais de mil artigos e encontrou evidências consistentes de que o vape está relacionado a padrões de estresse e dependência psicológica, criando um ciclo de uso precoce e prolongado.

E quanto aos fumantes que migram para o cigarro eletrônico?

Não é incomum que pessoas fumantes acreditem que mudar para o vape seja um passo para abandonar o vício. O cigarro é o maior e mais documentado inimigo da saúde vascular, mas isso não torna o cigarro eletrônico mais seguro.

“É trocar um risco conhecido por um risco novo, mas já comprovadamente perigoso. O vape não tem os produtos da combustão, mas introduz os riscos das partículas ultrafinas e dos solventes. Para o coração, o dano da nicotina e da inflamação vascular está presente e é grave em ambos os produtos”, esclarece Pablo.

No Brasil, a Anvisa mantém proibidas desde 2009 a venda, importação e propaganda dos dispositivos, com base na ausência de comprovação científica de segurança e na presença de substâncias tóxicas e potencialmente cancerígenas nos líquidos utilizados.

“O objetivo final para a sua saúde deve ser viver livre de ambos. As sociedades médicas, incluindo a Sociedade Brasileira de Cardiologia, não recomendam o vape como um método para parar de fumar”, complementa o cardiologista.

Como parar de fumar?

Se o objetivo é parar de fumar, seja o cigarro comum ou eletrônico, o primeiro passo é procurar ajuda médica e não tentar enfrentar isso sozinho. A dependência da nicotina é forte, e reconhecer que é preciso ajuda já demonstra bastante coragem e vontade de mudar.

O médico pode avaliar o seu grau de dependência, indicar o tratamento mais adequado e, acima de tudo, acompanhar de perto cada fase do processo. Hoje, existem tratamentos seguros e eficazes que reduzem os sintomas da abstinência e tornam a caminhada mais leve.

A combinação de apoio psicológico e uso de medicamentos é a mais recomendada, porque cuida do corpo e da mente ao mesmo tempo — ajudando a lidar com a vontade de fumar e com as emoções que surgem ao longo do caminho. Falar com familiares, amigos ou grupos de apoio também faz toda a diferença, especialmente nos momentos em que o desânimo ou a vontade de desistir aparecem.

Também é importante mudar os hábitos de vida, o que inclui praticar atividade física, investir em uma alimentação equilibrada e dormir bem à noite. Aos poucos, o corpo se recupera, o fôlego melhora, o paladar volta, e a sensação de bem-estar cresce a cada dia sem cigarro ou vape.

Leia mais: Câncer ocupacional: o que é e quais as profissões de risco?

Perguntas frequentes sobre cigarro eletrônico

1. O uso de vapes pode causar infarto ou AVC?

Sim! Pesquisas recentes apontam que exposição contínua a substâncias como nicotina e acroleína pode favorecer o estreitamento e a formação de placas de gordura nas artérias (aterosclerose), elevando significativamente o risco de doenças cardíacas, infartos e AVC. Isso pode acontecer mesmo em pessoas jovens e aparentemente saudáveis.

2. O vape pode ajudar a parar de fumar?

Não! Na verdade, estudos comprovam que o cigarro eletrônico não é eficaz para parar de fumar. Em muitos casos, os usuários acabam consumindo os dois produtos ao mesmo tempo, o chamado uso duplo, e permanecem dependentes da nicotina.

O método mais seguro e comprovado para abandonar o cigarro continua sendo o tratamento clínico e psicológico indicado por profissionais de saúde.

3. Existe algum tipo de cigarro eletrônico seguro?

Até o momento, nenhum estudo comprovou que exista um cigarro eletrônico realmente seguro. Mesmo os dispositivos que afirmam não conter nicotina podem liberar substâncias irritantes e tóxicas. A única maneira de eliminar o risco é não usar nenhum tipo de produto inalável que contenha nicotina ou solventes químicos.

4. O uso de vape pode causar dependência emocional?

Sim, a dependência da nicotina não é apenas física — ela envolve também uma série de aspectos emocionais e comportamentais. O hábito de segurar o dispositivo, a rotina de uso e a associação com momentos de prazer ou relaxamento reforçam a ligação emocional com o produto.

Por isso, o processo de parar exige apoio psicológico e estratégias de substituição, para que a pessoa aprenda novas formas de lidar com o estresse e a ansiedade.

5. O que acontece no corpo logo após usar um cigarro eletrônico?

Minutos após a inalação do vapor, a nicotina ativa o sistema nervoso simpático, liberando adrenalina e noradrenalina. Elas provocam aumento da frequência cardíaca, elevação da pressão arterial e contração dos vasos sanguíneos.

Para completar, as partículas químicas e metais presentes no vapor entram na corrente sanguínea e iniciam um processo de inflamação e estresse oxidativo, que, repetido ao longo do tempo, pode danificar o coração e os vasos.

6. Grávidas podem usar cigarros eletrônicos?

Não, o uso de vape durante a gestação é extremamente perigoso! A nicotina atravessa a placenta e pode prejudicar o desenvolvimento cerebral e pulmonar do bebê, além de aumentar o risco de parto prematuro, baixo peso ao nascer e complicações cardiovasculares no feto. O vapor também contém substâncias tóxicas que afetam diretamente a oxigenação do sangue materno.

Veja mais: Câncer: quais os principais fatores de risco?

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