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Alergias em crianças: como a escola deve lidar?
A escola é um ambiente em que o risco de exposição a substâncias alergênicas é constante, como alimentos e materiais

Dra. Brianna Nicoletti
5min • 23 de nov. de 2025

Nas crianças, o organismo ainda está em desenvolvimento, o que torna as reações alérgicas mais imprevisíveis e, muitas vezes, mais intensas | Foto: Freepik
Dermatite atópica, asma e alergias alimentares estão entre as condições mais comuns na infância e podem se manifestar logo nos primeiros anos da vida escolar. Na maioria das vezes, os sintomas de alergias em crianças aparecem de forma leve e podem ser controlados, mas algumas reações podem piorar rapidamente e evoluir para um quadro grave, como a anafilaxia.
Como a criança passa boa parte do dia na escola, o ambiente precisa estar preparado para protegê-la sem tirar seu direito de participar das atividades com os coleguinhas. Isso envolve protocolos bem definidos, uma equipe que saiba como agir em casos de crise, boa comunicação com os pais e atitudes práticas no cotidiano que garantam a segurança sem causar isolamento ou constrangimento. Vamos entender mais, a seguir.
Quais as alergias mais comuns na infância?
As alergias são reações exageradas do sistema imunológico a substâncias que, normalmente, seriam inofensivas. Nas crianças, o organismo ainda está em desenvolvimento, o que torna as reações alérgicas mais imprevisíveis e, muitas vezes, mais intensas.
Entre as mais comuns na idade escolar, a alergista e imunologista Brianna Nicoletti aponta:
- Alergias alimentares, como leite, ovo, amendoim, castanhas, trigo, soja, peixe e frutos do mar;
- Rinite alérgica e asma, que são desencadeadas por poeira, mofo, ácaros e perfumes;
- Dermatite atópica, que causa pele ressecada, coceiras e feridas podem piorar com calor, tecidos sintéticos ou suor;
- Alergia a picadas de insetos (como abelhas e vespas), comum em áreas externas, com risco de reações graves;
- Conjuntivite alérgica, que afeta os olhos, causando coceira, vermelhidão e lacrimejamento;
- Alergias de contato, causadas por substâncias como níquel (em fantasias, bijuterias), fragrâncias ou colas em materiais escolares;
Algumas alergias em crianças se manifestam de forma leve, como espirros ou coceiras, mas outras podem evoluir rapidamente para quadros graves, como a anafilaxia — uma emergência médica que exige socorro imediato.
Quais riscos a escola oferece para crianças alérgicas?
A escola é um ambiente coletivo, então o risco de exposição a substâncias alergênicas é constante — desde alimentos compartilhados no lanche até materiais escolares, poeira acumulada em salas mal ventiladas, mofo em ambientes úmidos, perfumes usados por colegas e até produtos de limpeza usados nos banheiros e corredores.
Mesmo com orientação, algumas situações inesperadas podem acontecer: um coleguinha que oferece um pedaço do lanche, uma atividade com materiais que causam alergia ou até uma troca de canetas com cheiro ou glitter pode desencadear uma crise alérgica.
De acordo com Brianna, em casos severos, o maior risco é a anafilaxia, uma reação alérgica aguda que exige atendimento imediato. Os sintomas podem surgir em poucos minutos e incluem inchaço dos lábios, língua ou rosto, dificuldade para respirar, chiado no peito, queda brusca de pressão arterial, vômitos, confusão mental e, em casos extremos, perda de consciência.
Sem intervenção rápida com adrenalina e suporte médico, a anafilaxia pode levar à morte. É por isso que toda a equipe da escola precisa estar preparada para reconhecer os sinais e agir rápido até que a criança receba o atendimento certo.
Comunicação entre a escola e os pais
No momento da matrícula, os pais devem entregar toda a documentação necessária, como laudos médicos, receitas atualizadas, o Plano de Ação com instruções detalhadas para emergências e os contatos diretos em caso de urgência. Tudo isso precisa ser renovado pelo menos uma vez por ano ou sempre que houver mudanças na condição de saúde da criança.
Além da papelada, é importante que a escola organize reuniões de alinhamento no início do ano letivo com os pais para revisar protocolos, esclarecer dúvidas e ajustar qualquer ponto necessário. Também é importante que a equipe pedagógica esteja ciente da condição da criança e saiba como agir no dia a dia.
Por fim, a escola precisa manter um canal direto e aberto com as famílias para resolver questões cotidianas — como dúvidas sobre merendas, passeios escolares, festas de aniversário ou uso de novos materiais em sala. Com essa troca próxima, a criança se sente mais acolhida e é possível prevenir problemas no dia a dia quanto a saúde e bem-estar dela.
O que a escola deve fazer em caso de crises graves de alergias em crianças?
Toda escola deve estar preparada para agir rápido diante de uma emergência alérgica, que deve ser previamente esclarecida pelos pais da criança. De acordo com Brianna, o protocolo nesses casos deve ser o seguinte:
- Plano de Ação Escrito Individual: elaborado pelo médico da criança, com orientações claras sobre sinais de alerta e primeiros socorros;
- Treinamento anual da equipe escolar: todos devem saber reconhecer uma anafilaxia, usar o autoinjetor de adrenalina corretamente e acionar o SAMU (192) sem hesitar;
- Kit de emergência acessível: precisa conter autoinjetor de adrenalina, anti-histamínico e broncodilatador com espaçador, conforme o plano médico;
- Registro da ocorrência: quem aplicou o medicamento, horário, evolução e contato imediato com os pais.
A especialista ressalta que, no caso de crianças que precisam de adrenalina autoinjetável, ela deve permanecer acessível, dentro da validade e identificada com o nome da criança.
“Qualquer adulto treinado (professor, coordenação, enfermagem escolar) pode e deve aplicar imediatamente diante de anafilaxia suspeita — não se deve aguardar confirmação médica para iniciar a adrenalina”, aponta Brianna.
Alimentação escolar: como manter a criança segura?
A alimentação costuma ser um dos pontos mais sensíveis no cuidado de alergias em crianças, já que o risco de ingestão acidental ou contaminação cruzada é alto — principalmente em escolas que oferecem refeições coletivas. Por isso, o cuidado com o preparo dos alimentos precisa ser rigoroso e bem coordenado entre todas as pessoas envolvidas.
Algumas boas práticas ajudam muito nesse processo, conforme apontado por Brianna:
- Cardápio personalizado, com todos os rótulos verificados e controle rigoroso de contaminação cruzada, usando utensílios e superfícies exclusivas, com preparo separado dos demais alimentos;
- Lista de ingredientes disponível para a família, garantindo transparência total sobre o que será servido e permitindo que os responsáveis avaliem os riscos;
- Treinamento constante da equipe de cozinha e cantina, com foco em lavagem correta das mãos, higienização dos utensílios e consciência sobre a gravidade de uma exposição acidental.
Com medidas simples, é possível que a criança alérgica se alimente com segurança na escola e se sinta incluída em momentos cotidianos na escola.
Quais são os sinais de alerta de alergias em crianças que exigem socorro imediato?
A equipe da escola deve saber identificar os principais sinais de anafilaxia, como:
- Urticária generalizada;
- Inchaço de lábios, olhos ou língua;
- Chiado no peito ou falta de ar;
- Rouquidão súbita;
- Dificuldade para engolir ou falar;
- Vômitos repetidos;
- Queda de pressão, palidez ou sonolência excessiva.
Na dúvida, utilize a adrenalina imediatamente, conforme o Plano de Ação da criança. Após a aplicação da medicação, o serviço de emergência (SAMU, 192) deve ser acionado imediatamente e os responsáveis legais da criança informados.
Durante esse tempo, a equipe escolar deve acompanhar a criança de perto, mantendo-a em posição confortável e observando possíveis mudanças no quadro clínico até a chegada do atendimento médico.
Leia mais: Alergia alimentar: dicas para comer fora com segurança
Como incluir a criança com alergia no ambiente escolar?
No dia a dia, os professores podem adotar estratégias simples para que a criança alérgica se sinta segura e incluída em todas as atividades da escola, sem constrangimentos ou exclusões. A Associação Brasileira de Alergia e Imunologia sugere algumas práticas:
- Converse com a turma: explique de forma simples e respeitosa que um colega tem alergia a certos alimentos e que todos podem ajudar. As conversas incentivam empatia e responsabilidade coletiva desde cedo;
- Desenvolva atividades educativas: aproveite projetos, rodas de conversa ou dinâmicas para reforçar valores como cuidado, generosidade e cooperação. Isso ajuda a naturalizar a convivência com as diferenças;
- Evite rótulos ou falas que isolem: tenha cuidado com palavras e frases que possam expor ou rotular a criança com alergia. O objetivo é que ela se sinta incluída, não marcada por sua condição;
- Nada de isolamento nas refeições: com supervisão e organização, é perfeitamente possível que a criança alérgica sente-se com os colegas e participe normalmente do momento das refeições, sem ser afastada do grupo;
- Planeje comemorações com antecedência: em festas de aniversário ou eventos com comida, avise a família da criança alérgica com antecedência. Assim, é possível organizar uma opção segura para ela sem que se sinta excluída;
- Oriente sobre lembrancinhas com comida: se a festa contar com brindes ou saquinhos de guloseimas enviados por outras famílias, avise previamente sobre a alergia da criança. Ela também precisa receber algo especial, sem riscos à saúde.
Veja também: Entenda como funciona a alergia alimentar e o que fazer
Perguntas frequentes sobre alergias em crianças
1. Existe risco ao fazer atividades ao ar livre com crianças alérgicas?
Sim, dependendo do tipo de alergia. Crianças alérgicas a picadas de insetos, por exemplo, correm risco em ambientes abertos e com vegetação. Já quem tem asma pode reagir mal a mudanças bruscas de temperatura, poeira ou poluição.
O ideal é sempre consultar o Plano de Ação e planejar com antecedência. Quando necessário, levar o kit de emergência, orientar a equipe que acompanhará o grupo e adaptar o espaço, como evitar áreas com gramado alto ou flores.
2. É permitido aplicar adrenalina sem autorização dos pais?
Sim! Em caso de suspeita de anafilaxia, a adrenalina deve ser aplicada imediatamente, mesmo sem autorização dos pais naquele momento. A medida é apoiada por protocolos médicos e pode salvar a vida da criança.
A escola precisa ter uma política clara sobre o uso da medicação, alinhada com profissionais de saúde e informada às famílias desde a matrícula.
3. A escola pode impedir que a criança com alergia participe de certas atividades?
Não, pois impedir a participação da criança por medo ou despreparo é uma forma de exclusão. Toda criança tem direito a participar da vida escolar, e cabe à escola adaptar as atividades conforme as necessidades de cada aluno. Isso pode significar trocar ingredientes, mudar o local de uma aula prática, ou orientar colegas sobre cuidados básicos.
4. Quais são os primeiros sinais de uma reação alérgica em crianças?
Os primeiros sinais costumam surgir rapidamente após o contato com o alérgeno, mas podem variar bastante conforme o tipo de alergia e a sensibilidade da criança. Os mais comuns incluem coceira intensa na pele, vermelhidão espalhada pelo corpo, olhos lacrimejando, espirros consecutivos, tosse seca, sensação de aperto na garganta e inchaço nos lábios ou pálpebras.
Ao observar qualquer um desses sintomas, mesmo que pareçam leves, é fundamental agir com atenção e seguir o Plano de Ação da criança.
5. Como identificar uma reação alérgica em crianças em bebês?
Em crianças muito pequenas, que ainda não conseguem expressar o que estão sentindo, é fundamental observar mudanças comportamentais e sinais físicos, como coçar partes do corpo de forma insistente, esfregar os olhos, tossir sem parar, ficar inquieto, chorar sem causa aparente, irritabilidade, recusar alimentos ou mostrar desconforto ao respirar.
Veja também: Janela imunológica: como prevenir alergia alimentar em bebês

